Primeiro, tenho que pedir vênia ao meu irmão, que certamente escreveria com muito mais prosa, poesia, acerto gramatical e interpretação inter-sub-meta-transcendental sobre o que essa banda foi capaz de fazer no curto espaço de tempo de sua existência (que ninguém sabe se teve fim, realmente).
Pra mim a banda começa com o "Bloco do eu sozinho". Por mais que se diga que uma banda pode (e até deve, em certos casos) mudar de som e de tendência, realmente parece (com raríssimas exceções que mostram que em algum ponto do disco de 1999 já nascia a banda de 2001) que são duas coisas completamente diferentes.
Nem falo do que se fez com Anna Júlia, tocada em todos os barzinhos-batizados-bate-estacas-boates-botecos até a exaustão, afinal, de uma maneira ou de outra, toda banda precisa de uma música para, pelo menos, entrar na mídia (ainda que isso nunca tenha sido o forte da banda mesmo).
Falo sim da própria tendência da banda, que depois de absorver elementos fortíssimos da MPB, da Bossa-Nova e do Samba, aparentemente o hard-core do primeiro disco nunca mais voltou, enquanto que as outras tendências (umas mais, outras menos) continuaram se misturando.
Digo até que algumas letras do primeiro disco talvez coubessem melhor em uma roupagem parecida com o que se viu nos discos seguintes, mas que nunca voltou a ser como o primeiro disco: "Tire esse azedume do meu peito, e com respeito trate a minha dor..." parece estar muito mais próximo de "...veja bem além desses fatos vis, saiba, traições são bem mais sutis. Se eu te troquei, não foi por maldade. Amor, veja bem, arranjei alguém chamado saudade", mas a levada é que parece não se encaixar muito nos versos. Mas tudo bem.
A banda, inclusive por causa do mal-estar causado pela gravadora do primeiro disco - que não queria seu produtor nem suas músicas - no segundo disco, parecia, realmente, que saía feito um pierrot perdido, mas procurando o seu bloco.
A primeira vez que vi Los Hermanos ao vivo foi num festival de verão do recife (quando merecia ser frequentado), em 2004, num dia que, de verão, só mesmo as monções, numa chuva torrencial que caiu e atrasou o começo dos shows em mais de duas horas, quando então entrou um Tony Garrido, pedindo desculpas pelo atraso ao público que já estava completamente encharcado.
Noite maravilhosa, com Alceu, Cidade Negra, Titãs, Skank, Natiruts, Mundo Livre, Cordel de Fogo, Otto.
A banda entrou para tocar às cinco da manhã, o show durou menos de uma hora, mas quando Marcelo Camelo começou a cantar "O Vencedor", a emoção tomou conta de todos, e vi os verdadeiros fãs (eu ainda não era um) emocionados, muitos chorando com as canções que eram executadas. Eu me emocionei com a emoção dos que estavam perto de mim e ficamos, eu e minha irmã, ensopados, mas olhando aquela apresentação que, para mim, foi um marco. De dia, todo molhado, vendo um povo cantar com uma vontade de quem estava pronto para, com a banda, enfrentar outra maratona como a que já tinha passado pela noite (e olha que Otto ainda tocaria depois disso...).
A partir daí, comprei "O bloco" e meu irmão se encarregou de comprar o resto, de tão mais fã que se tornou do que eu.
O certo é que num cenário musical onde proliferam bandas que fazem toda a trilha sonora de programas de fim de tarde (tudo bem, o Los Hermanos também já teve música incluída nesses programas), em que rezamos para que as bandas que são frutos da década de 80 resistam, em que os programas de calouros foram reformados para reality shows (onde nada se cria, tudo se copia - ou se destrói, ou se deturpa), os barbudos aparecem fazendo música de qualidade, com letras difíceis, profundas, com mensagens de amor, de dor, de saudade, de alegria, de vida, de velhice (os asilos, como diz meu irmão) em melodias ricas e que não têm como aparecer nas revistinhas de músicas cifradas.
Aliás, nessa cena (banda, letra, melodia), que ainda persiste, temos pouca coisa acontecendo - a não ser pelo Rappa, Nando Reis, Skank, Orquestra Imperial, Nação Zumbi (que ainda fazem, não vivem do que fizeram), ... Na minha lista, nada mais - E olha que esses aí são meio filhos de rama dos heróis de 80 e poucos. Uns outros são novos demais (Moptop, Vanguart, Mombojo, Little Joy..) e outros, apesar de constituirem um movimento muito bom, são outra coisa (como Móveis Coloniais de Acaju, ou o Teatro Mágico).
E ainda mais! Nessa letargia musical nesse formato, quando se constata a falta de músicos (olhem melhor por trás dessas bandinhas quando elas se apresentam) e de compositores, o Los Hermanos tinha logo dois de expressão maior: Marcelo Camelo e Rodrigo Amarante.
Juntos, foram capazes de fazer muita música bela, usando de recursos de linguagem difíceis, de trocadilhos simples e ricos, de ênclises, próclises e mesóclises, falando de histórias impossíveis, de amores perdidos, de viagens inimagináveis, de arrependimentos, de saudades, de encontros, de juventude perdida, de traições, de romances, de dor, de despedida, de viradas, de súplicas, de jeito de viver diferente, de simples contemplação do tempo, do só, do calmo, perdido, do perplexo, do calado, do valente.
Talvez por isso, ao sentir que seu bloco já não estava mais tão sozinho, a banda, encontrando o seu caminho, fez dos seus fãs os verdadeiros multiplicadores de suas mensagens, que, para mim, ao contrário daquelas músicas em que nos encontramos e nos identificamos, ficamos é procurando personagens que aparecem nas músicas da banda, nos emocionamos com eles, vivemos com eles as suas Odisséias de minutos e ficamos alegres com sua glória ou choramos as suas dores. Isso é o máximo em Los Hermanos.