Quando as rodas do avião tocaram no chão de Guarulhos, pensei: É hoje! Nem acredito!
A sensação ao entrar no Morumbi, mais ou menos às cinco da tarde, com uma temperatura perto dos 15 graus (e detalhe: eu morrendo, de bermuda e camiseta), me revelou uma das sensações mais legais em termos de manifestações musicais: Vou ter oportunidade de participar de um dos eventos mais incríveis da minha vida! E tudo apontava para tanto: O lugar (o cinquentão morumba) é lindo, as companhias ótimas, a cerveja gelada (mas também não tinha como esquentar...). Mas nada, absolutamente nada tirava o foco do que eu tinha ido ver ali: A maior banda de Rock em atividade.
Antes, uma esquentada com a Banda X, que mostrou o quanto estavamos distantes do palco, nas arquibancadas - é verdade - mas o quanto ficamos numa posição que fazia com que o som estivesse estrondantemente bom. Duas colunas de som estavam bem na nossa frente, o que facilitava tudo.
Pouco mais de nove da noite e a banda entra no palco para a abertura com a improvável "Go". Não bastasse, emendou com "Do the Evolution", já mandando o recado de que a noite seria impressionante.
Apesar da Surpresa inicial, é fato que essa é uma das características mais marcantes da banda: a imprevisibilidade do setlist. De fato, são mais de 80 músicas que potencialmnte podem ser tocadas. E é Eddie Vedder quem escolhe, normalmente minutos antes de cada show, as músicas que serão executadas. Isso faz com que - quem pode - acompanhe a turnê em todo o país, porque certamente escutarão variações bem significativas da execução da banda.
E Vedder disse: "Vocês são a maior platéia da turnê. Então merecem o show mais extenso." E assim foi: mais de duas horas de intensidade em um setlist com 29 músicas. Vedder, pouco depois, pediu desculpas, dizendo que ia falar em inglês com a plateira porque seu português era uma merda...". Estava bem a vontade e só trouxe ainda mais a galera pra se entregar ao momento.
De fato, apenas para registrar, se na quinta feira a banda executou "Daughter", "Corduroy", "Save You", "RVM" e "Porch" (acho que quatro das que mais gosto e, de todas, "Save You"), na sexta fizeram "Jeremy", "Wishlist", "Once", "Jeremy", "State of love and trust" e "Yellow Ledbetter", que encerrou a apresentação com a galera já em êxtase, as luzes do Estádio já acesas e uma multidão embasbacada cantando com a banda. Só para registro: "Last Kiss" poderia, certamente, ficar de fora por qualquer uma dessas que citei que foram tocadas na noite da quinta. Não faria a menor falta.
Os Blocos de música foram encerrados por "Black" - e todo o estadio cantarolando com a banda; "Jeremy" finalizou o segundo e "Yellow Ledbetter" pra fechar tudo.
Mas certamente restou claro que a condução do show foi toda feita com base no (ótimo) último trabalho da banda, o "Backspacer". Vieram, pela ordem "Got some" (a quinta a ser tocada); "Gonna See My Friend" (a oitava); "Amongst the waves" (a décima); "Unthought Know" (a décima quarta); "The Fixer" (a décima quinta) e "Just Breath" (A décima oitava - uma balada lindíssima).
A musicalidade da banda já é ponto absolutamente suficiente para gostar, mas depois de assistir PJ20 (o documentário sobre os vinte anos da banda), dá pra perceber porque os que tem um pouco mais de idade do que eu - e que foram adolescente ouvindo a banda - são tão fascinados por ela: O comprometimento que a banda tem com seus fãs produziu uma batalha que foi parar nos órgãos reguladores econômicos norte-americanos, numa alegação de enriquecimento ilícito por parte da Ticketmaster.
A partir daí a banda se colocava contrária ao monopólio da industria fonográfica e na produção dos shows. Além disso, foi (e é, mesmo sem repercussão midiádica - da qual Eddie Vedder parece ter verdadeira aversão) ativista a favor das campanhas por voto consciente e contra a política do Governo Bush (ainda que, em certas ocasiões possa ter enfrentado também resistência do público em shows...).
No palco, a banda mostra uma maturidade incrível e uma harmonia sonora que se vê pouco por aí - talvez no Coldplay e no REM... E Eddie Vedder trocou - porque a idade chega para todos - a loucura de escalar as estruturas metálicas dos palcos e execuções de Mosh que algumas vezes beiravam a loucura - pela companhia da guitarra e do violão, dando ainda mais vida às cordas da banda. A gritaria enlouquecida pela potência e equilíbrio vocal inigualáveis. Trocou a quebradeira do palco por duas pandeirolas que, no fim, joga para plateia. Trocou seus longos cabelos, bermudas e camisa quadriculada (que ainda aparecem no grunge(?)...) por um corte mais curto, uma calça jeans, camiseta e uma jaqueta ou camisa lisa preta...
Mas foi, do começo ao fim, um dos sonhos musicais se realizando. E assim: meio com a sensação de não ser assim tão ruim não ter nascido quando o Queen ou o Led Zeppelin já não existem mais. O Pearl Jam pode levar uma multidão de 60.000 pessoas ao delírio sem parafernalhas eletrônicas, sem enganação, sem efeitos visuais nem ninguém pendurado por cabos de aços ou coisa parecida... uma verdadeira aula de rock que fez todos os que estavam lá sairem se perguntando quando terão oportunidade, novamente, de ver tamanha manifestação de adoração à boa música, retribuída à altura por uma banda que parece ainda ter tanto para oferecer. Tomara que logo!
E para registro: nada melhor do que terminar o final de semana visitando meus tios e primos em São Bernardo! Havia dez anos que não sentava naquela sala pra tomar cerveja com meu tio. Parecia que há dez dias eu tinha estado ali. E a conversa na cozinha de tia Dinda continua a mesma! Todo mundo falando ao mesmo tempo! E meus primos são lindos! Melhor não poderia ser, definitivamente. E ainda deu tempo de ver todo mundo reunido no São Judas. Maravilha!
Fotos por Carol e Yve. Só a segunda que não é nossa.