Vi Maria Gadú no Faustão e um amigo meu comentou comigo que ela já estava começando a perder o valor, por ter ido num programa que, sem sombra de dúvidas, é um dos piores da TV brasileira.
Quanto ao programa, concordo em número e grau, mas quanto a esse aspecto da popularização da música boa, sempre surgem comentários puritanos sobre isso.
É que existem alguns fãs que acham que o artista (ou suas músicas) não devem se misturar com a mídia massificada, porque isso teria o condão de destruir a boa reputação ou a qualidade do artista.
Falam isso do Killers, depois de “somebody told me”, do Cranberries depois de “Ode to my Family”, do los hermanos depois que teve música incluída no programa “malhação” ou de outras bandas e artistas.
Outro dia perguntaram a Nelson Motta, no programa do Serginho Groisman, qual a música que o remetia a uma coisa boa, ou que lhe lembrava alguma emoção da sua vida e ele, dizendo que advogava em causa própria, disse que a música mais importante era a que ele tinha feito com Lulu Santos, “Como uma onda” e disse que assim pensava porque essa era uma música que, apesar de ter sido feita por ele e pelo Lulu, era uma música que já não pertencia mais aos autores, mas pertencia ao público, porque cada pessoa já tinha tomado para si a música e alguns cantavam quando estavam alegres, outros quando estavam triste e isso era a maior alegria para um compositor: quando a sua música já não lhe pertencia, mas que pertencia a todo o mundo.
Acho que o cantor, compositor, artista musical de maneira geral deseja isso, que sua música transcenda, ultrapasse a sua autoria e seja tomada pelo público. Acho que assim ele sente que cumpriu o seu desiderato - fez sua obra fazer parte da cultura de um povo.
Esse desejo puritano de algumas qualidades de fãs de que o artista fique na penumbra midiática parece ser coisa de quem adora ser “Cult”, alguns até mesmo, "kitsch", porque tem que gostar de coisa estranha, diferente do normal, que gosta de mostrar que conhece e gosta de coisas que poucos conhecem porque não há mídia promovendo a disseminação da música ou do artista.
Aí, na minha modesta opinião, há duas observações a serem feitas. A primeira é que nem todo artista que esta à margem da mídia é bom e nem todo o que está se promovendo pela mídia é ruim. A segunda é que o que importa mesmo é a qualidade da música, sendo o fato de expansão pela mídia de música de qualidade muito positiva.
Quando a música é boa, quando é tomada pelo público realmente, perde a idade e perde até a autoria (quantas vezes já não ouvi alguém dizer que “Vamos Fugir” do Skank (do Gil, na verdade) é muito legal ou que “Além do Horizonte” do Jota Quest parece uma música do Roberto... e isso acontece com o Elvis, com os Beatles, com o Michael e com vários outros que são e serão regravados, remixados, homenageados...)
Por outro lado, isso também é o que faz as músicas de péssima qualidade (com ou sem mídia) terem a duração de um suspiro e serem completamente descartáveis. A utilização desse tipo de música (ligada a temas fúteis, frívolos, apelativos e afins) é sempre passageira, serve a determinadas ocasiões, mas não se integram à bagagem cultural de ninguém.
Por isso, não acho (ao contrário de alguns muitos) que o fato da utilização da mídia de massa tenha o condão, por si só, de deteriorar ou destruir o bom artista ou a boa música. A não ser quando a produção do artista se liga diretamente à prática mercantil da gravadora, distribuidora ou editora (ter que lançar um álbum por ano, por exemplo) ou então quando, depois de atingir um bom patamar na própria mídia, o artista passe e achar que pode fazer qualquer porcaria que será engolido pelo público. Aí é outra coisa.
Ciro Fernandes – Gravura
Há 5 horas